Tuesday, October 26, 2010

TIJOLAÇO CONTRA OS TIJOLINHOS

O Globo Esporte anunciou hoje que, mesmo sem a credibilidade de ZICO à frente do projeto, o Flamengo quer retomar a campanha dos tijolinhos — a venda de tijolos personalizados à torcida, pela bagatela de R$ 250 cada, para a construção do CT em Vargem Grande. A notinha no site da Globo contém duas passagens curiosas, que destaco aqui.

Em primeiro lugar, o registro, em tom meramente informativo, sem um único ponto de exclamação, de que o projeto, “prioridade do ídolo, [...] teve sua fonte de renda atrasada justamente por conta do envolvimento dele”. Os srs. André Casado e Eduardo Peixoto bem podiam explicar o alcance dessa afirmação. Se estão denunciando que a quadrilha aqui identificada atrasou deliberadamente o projeto, com o objetivo único de enfraquecer o ZICO, acreditamos de antemão no que nos contam. Mas era de bom tom dar nome aos bois.
Em segundo lugar, a afirmação impagável do sr. Henrique Brandão, vice-presidente de marketing:

— É uma campanha da torcida do Flamengo, que tem 33 milhões de amantes. Foi uma minoria que reclamou, mas isso já passou. Temos plena confiança no sucesso dela, mesmo sem um garoto-propaganda, que não é tão necessário. E não descartamos que o ZICO ajude no que ele puder. Só não é um projeto pessoal dele.

 Nós aqui não temos motivo algum para duvidar de antemão da seriedade do sr. Henrique Brandão, mas “garoto-propaganda” é o caralho! O ZICO, na qualidade de diretor de futebol, era o avalista — o único avalista crível — da honestidade do projeto. Sem ele à frente, não há mais garantia alguma de que o dinheiro arrecadado vá servir, efetivamente, para a construção do CT, e não para o desfrute dos que cansaram de viver às custas de nossa paixão. O próprio ZICO expressou as dúvidas fundadas de toda a torcida ao disparar:

— Não conversei com ninguém desde que saí do clube. Para eu participar de qualquer campanha, teria que ser de fora para dentro, com verba carimbada, sem passar por ninguém de lá, pois perdi a confiança em algumas pessoas que estão no clube.

Perfeito o Zicão, no que diz respeito ao destino dos fundos. O clube faria bem em dar-lhe ouvidos, reconhecer que tem um imenso problema de credibilidade e desenhar um esquema jurídico criativo pelo qual esses recursos não terminem, sem controle algum, à livre disposição dos cartolas.

Mas há uma questão mais profunda, filosófica mesmo, que o ZICO não abordou, que tem a ver com a definição de quem é o dono do Flamengo. A nosso ver, não é correto, não é honesto, não é decente o clube recorrer à torcida numa emergência, jogando com a paixão de 35 (não 33) milhões de pessoas, ao mesmo tempo em que vicejam, lá mesmo na Gávea, visões como a que registramos aqui, que tornamos a citar ipsis litteris:

— O Flamengo é dos sócios, será gerido pelos sócios, para os sócios e em benefício dos sócios. A torcida que se foda. Se os sócios decidirem que o futebol ficará em segundo plano, assim será feito.

Não há nada de errado, em si, em a torcida contribuir para aumentar o patrimônio do clube — desde que isso se faça num ambiente que não seja hostil à idéia mesma de a torcida influir nos destinos do clube. Uma estrutura viciada, incapaz de implementar qualquer projeto sério de sócios off-Rio, capaz de bloquear indefinidamente qualquer proposta que dê voz e voto a esses milhões de torcedores, não tem legitimidade para vir agora pedir dinheiro à torcida.

As duas discussões têm de se dar simultaneamente. E não há condições de fazê-lo enquanto o clube estiver nas mãos da corja que hoje o comanda.

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